sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Capítulo 1

Asdfghjkl<333



 Como todas as manhãs minha mãe preparava o café enquanto meu pai colocava os pratos sobre a mesa:
 - Pegue os talheres para mim querida - Disse ele calmamente. Enquanto fazia o que ele pedira Anneliese aparece na cozinha com o rosto amassado por ter acabado de acordar:
 - Nossa nunca vi gostar tanto de dormir - Eu brinquei.
 - Nossa como gosta de me criticar- Ela falou entre risadas.
 - Mas é claro. Como irmã mais velha é meu dever te irritar - Anneliese é um ano mais nova que eu, mas apesar da proximidade de idade somos totalmente diferentes. Ela tem cabelos castanhos escuro que batem na altura do ombro, olhos verdes e é muito alta para sua idade. Já eu sou magra e de estatura media, nem muito alta, nem muito baixa, tenho cabelo preto e comprido ate a cintura, liso na raiz e ondulado nas pontas e o que mais gosto em mim são meus olhos azuis cor do mar, não me acho muito bonita, meus pais dizem que sou linda, mas dizem que não se deve confiar na opinião dos pais em relação a aparência dos filhos. Acho Anneliese mil vezes mais bonita que eu.
 - Meninas por favor, parem com a brincadeira e venham tomar café, vocês tem muito trabalho a fazer e se ficarem de risadinhas a manhã toda vão acabar levando bronca do supervisor - Meu pai diz com um ar de preocupação.
 A 5 anos atrás os Estados Unidos declarou guerra a Mersóvia, pais onde vivo, após anos de conflito o exército Mersóvio foi bombardeado e sem dinheiro, força militar e derrotados fomos obrigados a assinar um tratado que nos tornou colônia dos EUA. Assim Arthur Filds foi escolhido nosso presidente permanente, e junto com sua esposa Vivian Filds e seu filho Andrew Filds, que meses depois voltou para seu pais, iniciou um governo corrupto e abusivo. Somos obrigados a trabalhar como escravos e em troca não recebemos nem se quer um único centavo, todo o dinheiro é enviado à metrópole que como pagamento por nossos serviços nos manda apenas alimentos e roupas. Meu pai trabalha na produção de cimento e minha mãe na produção de tecidos, Anneliese trabalha na criação de galinhas e eu sou responsável pelas plantações. Em cada setor trabalhista há um supervisor e caso desrespeitarmos alguma regra ou não efetuarmos nosso trabalho com qualidade somos vítimas de punições. Eu e minha família somos contra o governo de Arthur e ao fato de sermos colônias, e por isso participamos de um grupo Opositor anônimo, e a grande preocupação de meu pai é a possibilidade do grupo ser descoberto pelos governantes que no mínimo matariam todos os integrantes.
 Tomo café dou um beijo em meus pais, um tapinha na cabeça de Anneliese e vou trabalhar.
 Quando chego na plantação Julian já esta lá. Ele é líder do grupo rebelde e meu melhor amigo, certa vez Anneliese me disse que ele gosta de mim não apenas como amiga, mas eu acho que ela só esta fantasiando, quando a amizade é muito grande as pessoas começam a inventar coisa onde não tem.
 - Amélinha, tudo bem - Ele disse logo depois de abrir um sorriso gigante.
 - Você sabe que eu odeio que me chama assim, você é a pessoa mais irritante desse mundo - De fato, ser chamada por esse apelido ridículo me tira do sério.
 - Me critique a vontade, sei que você não aguentaria viver um dia sem mim.
 - Você é um convencido, isso sim!
 - Convencido não, realista.
 - Parem de conversa e comecem a trabalhar - gritou o soldado Pey. Ele é o supervisor das plantações - hoje o dia tem que ser produtivo.
 - Sim senhor! – Julian diz alto.
 Depois de um dia inteiro de trabalho e esforço estava cansada, sentia dor nos meus braços de tanto pegar a terra com a pá. Julian falou enquanto caminhávamos:
 - Posso te deixar em casa?
 - Você mora na direção oposta da minha, não precisa não Ju.
 - Preciso sim. Faço questão de te acompanhar e não aceito um não como resposta.
 - Sendo assim, tudo bem.
 Depois de aproximadamente 25 minutos de caminhada chegamos em minha casa. Julian olhava fixamente em meus olhos e isso me assuntava um pouco, a maneira como ele me olhava era um pouco estranha, diferente, parecia que ele estava observando cada detalhe meu, cada pedacinho de mim, não gosto de ser o centro das atenções então fiquei um pouco sem graça. Depois de 5 minutos em silencio Julian disse:
 - Apesar de querer ficar tenho que ir Amélia, nos vemos daqui a pouco certo?
 - Claro que sim...
 Ele me deu um beijo na testa e foi embora. Era quarta feira, e todas as quartas e sextas minha família participava do encontro anônimo dos Opositores, Julian era o líder do grupo e atualmente discutíamos uma possibilidade de derrubar o governo, apesar das quase inexistentes possibilidades ainda tínhamos esperança. Os Opositores diferente da maioria da população não aceitavam o fato de serem obrigados a viver como indecentes, sem condições nenhuma, lutávamos e planejávamos o dia do nosso triunfo, o dia que derrubaríamos a monarquia de Arthur Filds e finalmente teríamos liberdade.
 Entro em casa e vejo Annelise na janela, logo ela pergunta:
 - Você voltou para casa junto com o Julian?
 - Sim Anne, por que?
 - Apenas uma curiosidade - ela falou friamente - vou para o quarto me arrumar.
 - Tudo bem, depois que você tomar banho eu vou.
 Minha mãe entra na sala sorridente e segurando uma caixa vermelha cintilante:
 - Hoje fui no pátio do governo bem cedinho pegar as roupas que estavam sendo distribuídas. Fui uma das primeiras a chegar então consegui as melhores peças, peguei um vestido rosa para a Anneliese e quando vi esse azul aqui lembrei de você, vai realçar seus olhos ainda mais. Use hoje no encontro Opositor.
 - Nossa mãe, obrigada! - peguei a caixa e abri - Era o vestido mais lindo que já vira em toda minha vida - Ele é maravilhoso.
 - Sim filha, é lindo!
 Depois de tomar um banho rápido por conta do horário fui para o quarto e me troquei, coloquei o vestido azul e quando me olhei pelo espelho realmente me senti maravilhosa. Geralmente não íamos arrumados aos encontros opositores, mas hoje em especial nosso grupo completa 2 anos de existência e como comemoração Julian organizou um jantar, será um momento mais descontraído, sem planos rebeldes nem planejamentos de ataques, algo muito raro de acontecer.
Anneliese demorou muito para se arrumar, mas quando enfim todos estavam prontos esperamos dar meia noite, horário que a maioria da população já nem sonhava em passar pela rua e saímos. Nos encontrávamos em um galpão abandonado na saída da cidade, era um lugar literalmente esquecido pela sociedade, ninguém nem lembrava de sua existência.
 Quando chegamos o galpão já estava cheio, estávamos atrasados, e quando meu pai abriu a porta todos olharam em nossa direção. A principio pensei que o motivo do silencio era o fato de estarmos atrasados, mais depois percebi que todos estavam olhando para mim e isso fez meu rosto ficar corado de vergonha. Logo todos voltaram a conversar e desviram o olhar me fazendo sentir um alivio imenso.
 Logo vi Julian vindo em minha direção sorridente como sempre:
 - Meu Deus, o que ouve com você?
 - Como assim?
 - Você está linda, nem parece a Amélia que eu conheço - Ele falou rindo.
 - Muito engraçado você - falei nervosa.
 -  É brincadeira Amélia, você é linda, mais hoje está maravilhosa - Novamente meu rosto ficou vermelho como um pimentão.
 - Obrigada Ju, é gentileza sua.
 - Não, não é não. Viu como todos te olharam quando você entrou?
 - Bobagem, ninguém me olhou, mas mudando de assunto, o que tem pra comer? Estou faminta - Falei.
 - O governo essa semana nos deu muito pouco, em minha casa tem praticamente pães e fubá.
 - Em minha casa a situação está parecida, minha mãe me disse que eles deram roupas, mas comida que é bom, quase nada.
 - O que conseguimos trazer foi um bolo de fubá, pães, e a família do Jorghe conseguiu trazer peixe e carne.
 - Então estamos esperando o que? vamos comer! - falei sorrindo.
 Depois de uma bela janta sentamos em um banco e começamos a conversar. Anneliese contava piadas totalmente sem graça e Mike, garoto que cuidava das galinhas com ela, ria sem parar. Julian não parava de olhar para mim nem se quer um minuto.
 Foi uma noite muito agradável, conversamos, nos divertimos muito, e depois de tudo isso nossos pais decidiram ir para casa. Anneliese se despediu dos meninos e das suas melhores amigas Jelly e Paty, deu um abraço em Julian e disse:
 - Amélia, estamos te esperando lá fora.
 - Só vou me despedir do pessoal e já vou.
 - Tudo bem - ela disse.
 Cumprimentei Jelly e Paty, apesar de não ter muita intimidade com elas, me despedi de Mike, Josh e Caio e depois fui falar com Julian:
 - Já está indo? - ele perguntou.
 - Sim, amanhã temos que acordar cedo para ir trabalhar, você deveria ir também. 
 - Amélia, eu sou o líder dos opositores, sou o último a sair daqui pois tenho que fechar o galpão, mas logo já estou indo também.
 - Tudo bem. Até amanhã!
 Ele me beijou na testa e eu fui embora. Julian tinha esse costume, beijar as pessoas na testa, eu acho isso fofo, é como se ele dissesse “eu cuido de você”.
 A rua estava deserta e se meu pai não estivesse lá confesso que estaria morrendo de medo. Assim que chegamos em casa a primeira coisa que fiz foi colocar a camisola e ir deitar, amanhã o dia será longo.
            * * *
 Na manhã seguinte acordei com os raios solares invadindo meu quarto, senti meus olhos pesados de tanto cansaço, mas não podia me atrasar, caso isso acontecesse o supervisor Pey me castigaria.
 Pulei da cama, coloquei uma calça de malha, uma regata cinza e fui para a cozinha tomar café. Quando entrei meu pai logo disse:
 - Bom dia minha querida!
 - Bom dia pai, como passou a noite?
 - Bem, bonequinha!
 - Deixe de conversa e venha tomar seu café, já são sete e meia, você esta atrasada- disse minha mãe.
 Sentei na mesa e comecei a comer. Enquanto saboreava meu pedaço de pão perguntei:
 - Onde está Anneliese?
 - Ela saiu mais cedo para o trabalho, seu supervisor pediu que ela chegasse com meia hora de antecedência - disse minha mãe.
 - Querida, onde esta o leite? - meu pai interrompeu.
 - Não temos leite - ela disse com o olhar triste.
 - Como assim? - perguntei.
 - Essa semana o governo só nos deu pão e feijão, a cada semana eles diminuem a quantidade de comida.
 Fiquei preocupada com a possibilidade de passar fome, mas o fato de eu estar atrasada me pareceu mais importante no momento.
 Dei um abraço em minha mãe, um beijo na careca de meu pai e sai correndo pelas ruas.
 Quando cheguei na plantação Julian já estava lá, como sempre, assim que me viu ele veio em minha direção com um sorriso e disse:
 - Atrasada como sempre...
 - Implicante como sempre - eu disse entre sorrisos.
 - Vamos trabalhar antes que o Pey venha dar bronca.
 A manhã passou em um piscar de olhos e quando me dei conta já era o horário de almoço.
 Pela primeira vez fomos autorizados a almoçar em casa, mas antes que eu pudesse ir Julian me chamou e disse:
 - Gostaria que você conhecesse um lugar Amélia, vamos?
 - Agora?
 - Sim - ele disse.
 - Mas e o almoço? - perguntei.
 - Um dia sem almoço não vai te matar, voltaremos logo.
 A principio pensei em recusar o convite, mas então comecei a buscar em minhas lembranças a última vez que sai para me divertir, a última vez que sai junto com o meu melhor amigo, foi quando me dei conta de que não fazíamos isso a muito tempo, então simplesmente decidi ir.
 - Tudo bem então.
 Entramos em uma mata fechada perto do galpão dos opositores.
 - Se quisermos chegar hoje vamos ter que correr - Julian me disse com um olhar maligno.
 - Jura?
 - A não ser que a menininha esteja com preguiça...
 - É claro que não estou. Vamos correr!
 Começamos a correr pela mata, Julian segurava minha mão e me conduzia entre as folhas verdes. Sentia uma onda de adrenalina tomando conta do meu corpo, uma sensação de liberdade, a muito tempo não me divertia assim.
 Depois de uma longa e espetacular corrida chegamos a um lago. Suas águas eram cristalinas e sua cor era um azul extremamente parecido com o tom dos meus olhos.
 - Nossa, que lugar lindo!
 - É aqui que venho quando quero fugir dos problemas - Ele disse ofegante pela corrida. 
 - É maravilhoso!
 - A melhor parte você ainda não sabe. Vamos nadar.
 - Como assim nadar? Eu não trouxe roupas secas para usar depois e...
 - Não tem problema Amélia, hoje o sol está ardendo, antes de chegarmos na plantação elas já estarão secas.
 - Não sei se é uma boa ideia, Julian...
 - A quanto tempo não se diverte ou melhor, a quanto tempo não nos divertimos juntos? 
 - Muito tempo...
 - Então Amélia, vamos?
 - Tudo bem, como sempre você me convenceu.
 Ele me ergueu e me colocou em suas costas, saiu correndo e pulou no lago.
 - Ahhh, como a água está fria - eu gritei.
 - Deixe de ser fresca, a água está maravilhosa!
 Passamos a tarde toda nadando, ele jogava água em mim e eu retribuía a brincadeira. Não me divertia assim a anos.
 Toda a alegria foi embora quando voltamos à realidade.
 - Julian já está escurecendo, não voltamos para a plantação e o supervisor Pey vai nos castigar!
 - Meu Deus Amélia, perdemos a noção do horário!
 - E agora, o que vamos fazer?
 - Correr e tentar nos explicar para ele.
 Corremos tanto que chegamos lá em menos de 10 minutos. Pey estava nos esperando com uma expressão de quem estava prestes a matar alguém.
 - Posso saber onde os irresponsáveis passaram a tarde toda?
 - Podemos expli...- Julian foi interrompido no meio de sua tentativa de explicação.
 - Acho que vocês esquecem que são mais insignificantes que porcos, e que se não  
trabalharem serei obrigado a denunciá-los ao governo central que não hesitará em cortar o envio de mantimentos e roupas para suas famílias, é isso que vocês querem, irresponsáveis?
 - Não senhor – eu disse. Uma lágrima escorreu pelo meu rosto.
 - Não serei tão duro com vocês, obviamente haverá uma punição, mais não será severa a esse ponto. Vocês terão que passar a noite aqui na plantação para colocar em dia o trabalho que não foi feito.
 - Obrigada pela segunda chance senhor - Julian disse - Pela manhã o trabalho estará pronto.
 -Espero que sim.
 Depois que ele foi embora eu e Julian começamos o serviço.
 Cavamos por aproximadamente duas horas e meus braços já estavam dormentes, por fim colocamos as sementes e regamos a plantação toda. O trabalho já estava quase todo pronto, só precisávamos arrumar o depósito de sementes e finalmente terminaríamos. A sala feita depósito estava uma bagunça, o supervisor Pey fez isso por pura maldade, seria preciso 2 terremotos para deixar a sela no estado que se encontra.
 A madrugada tornava-se dia quando terminamos. Eu e Julian sentamos na terra fria e acabamos pegando no sono.
 Quando acordei já havia amanhecido, Julian ainda dormia como uma criança e quando me dei conta, estava deitada em seu peito o movimento assuntado que fiz quando levantei dali fez com que ele acordasse. Nunca tinha visto Julian com cara de sono, era totalmente engraçado, poderia zombar dele com isso eternamente.
 - Bom dia belo adormecido - eu disse.
 - Bom dia Amélinha - ele disse logo depois de bocejar.
 - Já vai começar a me provocar?
 - Claro que não, eu nunca faço isso!
 - Se nunca pra você quer dizer o tempo todo, eu concordo – soltei uma gargalhada 
 - Pey já chegou?
 - Ele chega daqui meia hora.
 - Enquanto esperamos, o que acha de comer um pedaço de pão?
 - Onde vamos encontrar um pão Julian?
 - Ontem antes de vir pro trabalho eu coloquei um em minha bolsa, sempre faço isso. É uma precaução.
 - Muito esperto você.
 Ele abriu a bolsa e pegou o pedaço de pão, depois de o partir ao meio me deu a metade maior. Enquanto devorávamos o alimento Julian disse:
 - Você fica linda enquanto come.
 - Para de brincadeira, Julian!
 - Não estou!
 Seus olhos encontraram os meus e ficamos desse jeito por um longo tempo. Não sabia ao certo o que estava acontecendo naquele momento, mas de uma coisa eu tinha certeza, queria repetir esse dia muitas e muitas vezes.